Confira a entrevista com o jornal O Hoje
O HOJE: Para você, atuante no mundo da moda, qual a importância de Zuzu Angel na história fashion brasileira?
ELEONORA HSIUNG: A Zuzu Angel foi importante em vários aspectos. Ela ajudou a colocar a moda brasileira no mapa internacional, com uma moda bonita, elegante e que valorizava materiais e tradições locais, fazendo algo que eu aprecio muito, que é usar isso com uma linguagem própria e sem cara de folclore (o que, entenda-se, também tem seu valor).Mas mais que isso, eu a admiro pela garra de ter escalado na história a despeito de ser uma mulher e uma mulher de origem humilde. Respeito sobremaneira o fato de não ter se calado perante os horrores da ditadura e ela o fez de forma corajosa. E admiro enormemente a capacidade que ela teve de transformar sua dor, seu luto em fonte de inspiração para suas criações.
É muito poderosa a capacidade de transformar a dor em algo positivo. Se não fosse isso a humanidade estaria estagnada.
OH: Nos dias de hoje, que se cobra tanto posicionamento perante aos fatos, temos algum(a) “Zuzu Angel” no cenário geral? (Não só no meio da moda ou artístico)
EH: Olha, eu acho essa coisa de obrigatoriedade de se posicionar chata, porque gera posicionamentos falsos. Cada um tem que falar e criar sobre o que quiser e cabe aos consumidores escolherem o que consome. As marcas que não refletirem o Zeitgeist naturalmente vão perder voz ou vão falar com o nicho com que se identificam e tudo bem.
Muitas marcas começaram a panfletar explicitamente - com maior ou menor verdade - sobre causas legítimas. Eu, particularmente, acho mais legal quando, ao invés de panfletar - como a Chanel e a Dior fizeram em desfiles recentes -, elas incorporam essas causas na estrutura de seus negócios e na estética de suas criações, de maneira natural. Quando, por exemplo, uma marca decide incluir no seu quadro, sobretudo em posições de comando, representantes de fatias da sociedade que precisam de representatividade (Há um estudo da Nextail que afirma que a quantidade de mulheres ocupando cargos de CEO na indústria da moda aumentou em quase 100% em 2020). Ou como faz a marca Off-White, do queridinho fashion Virgol Abloh, ajudando a angariar fundos para a organização negra feminista Black Woman Radicals. Ou, falando de incorporar com naturalidade suas causas em suas estéticas, eu citaria a goiana Naya Violeta, que será a primeira goiana a participar da SPFW ou a estilista britânica Wales Bonner. Ambas negras.
Mas se eu precisasse citar dois nomes importantes e na minha visão legítimos que fazem do protesto a fonte de suas criações, eu citaria o artista chinês Ai Wei Wei e o grupo russo Pussy Riot.
OH: O trabalho de Zuzu Angel influenciou o seu de alguma forma?
EH: Diretamente não. Mas com certeza ela ajudou a pavimentar um caminho que hoje eu posso percorrer.
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ELEONORA HSIUNG: A Zuzu Angel foi importante em vários aspectos. Ela ajudou a colocar a moda brasileira no mapa internacional, com uma moda bonita, elegante e que valorizava materiais e tradições locais, fazendo algo que eu aprecio muito, que é usar isso com uma linguagem própria e sem cara de folclore (o que, entenda-se, também tem seu valor).Mas mais que isso, eu a admiro pela garra de ter escalado na história a despeito de ser uma mulher e uma mulher de origem humilde. Respeito sobremaneira o fato de não ter se calado perante os horrores da ditadura e ela o fez de forma corajosa. E admiro enormemente a capacidade que ela teve de transformar sua dor, seu luto em fonte de inspiração para suas criações.
É muito poderosa a capacidade de transformar a dor em algo positivo. Se não fosse isso a humanidade estaria estagnada.
OH: Nos dias de hoje, que se cobra tanto posicionamento perante aos fatos, temos algum(a) “Zuzu Angel” no cenário geral? (Não só no meio da moda ou artístico)
EH: Olha, eu acho essa coisa de obrigatoriedade de se posicionar chata, porque gera posicionamentos falsos. Cada um tem que falar e criar sobre o que quiser e cabe aos consumidores escolherem o que consome. As marcas que não refletirem o Zeitgeist naturalmente vão perder voz ou vão falar com o nicho com que se identificam e tudo bem.
Muitas marcas começaram a panfletar explicitamente - com maior ou menor verdade - sobre causas legítimas. Eu, particularmente, acho mais legal quando, ao invés de panfletar - como a Chanel e a Dior fizeram em desfiles recentes -, elas incorporam essas causas na estrutura de seus negócios e na estética de suas criações, de maneira natural. Quando, por exemplo, uma marca decide incluir no seu quadro, sobretudo em posições de comando, representantes de fatias da sociedade que precisam de representatividade (Há um estudo da Nextail que afirma que a quantidade de mulheres ocupando cargos de CEO na indústria da moda aumentou em quase 100% em 2020). Ou como faz a marca Off-White, do queridinho fashion Virgol Abloh, ajudando a angariar fundos para a organização negra feminista Black Woman Radicals. Ou, falando de incorporar com naturalidade suas causas em suas estéticas, eu citaria a goiana Naya Violeta, que será a primeira goiana a participar da SPFW ou a estilista britânica Wales Bonner. Ambas negras.
Mas se eu precisasse citar dois nomes importantes e na minha visão legítimos que fazem do protesto a fonte de suas criações, eu citaria o artista chinês Ai Wei Wei e o grupo russo Pussy Riot.
OH: O trabalho de Zuzu Angel influenciou o seu de alguma forma?
EH: Diretamente não. Mas com certeza ela ajudou a pavimentar um caminho que hoje eu posso percorrer.